Ja que esses dias estou vivendo de uma saudade gostosa...
Coloco aqui o conto que mais gosto... um monte de gente conhece mas vale a pena ler de novo!
Linhas e Ligações
- Alô!?
- Alô!?
- Alôô!? Quem não está falando?
- Poxa, se você não falar nada fica difícil se comunicar, né?
...
E foi assim durante 3 semanas, na mesma hora e um mesmo tempo de silêncio.
No 3o dia, eu já estava achando graça... cheguei a brincar e perguntar coisas pessoais como cor dos olhos, altura, como se vestia... perguntei também como tinha encontrado meu telefone mas o silêncio era o mesmo e às vezes a pessoa desligava na minha cara quando eu me empolgava e os 5 minutos se passavam.
No 4o dia, uma sexta-feira, eu não estava em casa às 10:34, hora que aquele ser me ligava, mas o celular tocou. Eu nem liguei uma coisa à outra até perceber que era o mesmo silencio. Olhei a hora e vi que já eram 10:36, um minuto a mais do que o habitual, como se a pessoa tivesse ligado para minha casa e não tivesse me encontrado.
Mas como descobriu que eu não estava em casa? Como sabia o numero do celular? Pensei nisso tudo depois de desligar sem ouvir uma só palavra.
Não comentei nada disso com ninguém porque achei que era uma brincadeira e se realmente fosse, uma demonstração de nervosismo ou ansiedade seria motivo de gargalhadas eternas...
Lá pelo 9o dia, comecei a ficar com medo... sei lá! Quando você tenta se livrar de algo que não domina e não consegue faze-lo, bate um desespero insuportável. Nunca tinha pensado em desligar, mas nesse dia não agüentei.
- Alô!?
- Olha, você não tem o que fazer não, é??? Vai arrumar outro palhaço pra ligar! – e bati o telefone com toda força e raiva que tinha.
Tão logo desliguei o telefone tornou a tocar. Um frio na barriga me fez sentar e atendi outra vez:
- Alô!?
- Não desliga mais!!! – foram as primeiras palavras em 9 dias.
Uma voz doce, meiga e soava como se implorasse minha presença.
- Você tá com algum problema??? Posso te ajudar em alguma coisa? Sabe... gosto de falar com você – perceba que apenas eu havia falado por mais de uma semana – pode falar comigo que eu juro que não desligo mais! – Sem resposta
- Como posso saber mais sobre vo... - e ela desligou, exatamente quando o tempo se acabou.
Fiquei intrigado. Tive uma vontade enorme de ligar para ela pra continuar a ouvir seu silêncio. Pensei que era absurdo estar pensando naquilo mas eu estava!
Mal dormi aquela noite. Olhei para o telefone por horas afim de que ele tocasse, escrevi pra mim mesmo como faço quando tenho que tomar decisões importantes. Andei pela casa tentando recordar e descobrir de quem era aquela voz.
Acordei dolorido. Havia dormido na sala, diante da TV, no sofá. Eram 8:30 e faltava muito para que o telefone tocasse. Peguei meus módulos, meu bloco de folhas e fui estudar.
Lá pelas 9:40 resolvi sair. Tirei a Ferrari da garagem e peguei o celular. O problema era que eu não tinha a mínima idéia de pra onde ir. Tinha que escolher entre ir para a esquerda ou direita mas continuei parado. Depois de uma eternidade em repouso voltei pra casa de novo. Não sabia o que fazer, só queria que o tempo passasse.
É engraçado como o tempo passa de forma inversamente proporcional à nossa expectativa! Percebi isso quando cheguei no quarto de volta e ainda eram 5 para as 10.
Fiquei deitado, fazendo qualquer coisa esperando o tempo passar mas um segundo demorava uns 3 pra seguir adiante... até que o telefone tocou.
- Alô!? – atendi radiante!
- Oi Bito... sou eu, Jay!
- Oi Linda! Como vai? A quanto tempo, hein? Tudo certinho?
- Tudo certo... mas to chateada!
- Com o que?
- Estudo... to com medo do vestibular, você sabe!
- EI! Relaxe! Isso passa, tudo passa... até Uva passa! Menos o tempo... – completei!
- O que? – perguntou ela curiosa e desentendida, depois de uma gargalhada por causa da piada da Uva.
Aproveitei pra olhar o relógio e me lembrei da ligação da menina. Já se passavam 3 minutos da hora de sempre e tratei de desligar e despachar minha amiga.
Me desesperei. Mais um dia sem falar com ela eu não ia agüentar – perceba que novamente esqueci do fato de que só eu falava! - Mas minha agonia foi passageira, logo após sair do quarto o telefone tocou outra vez.
O mesmo silêncio, agora também da minha parte. Passou um tempo curto e comecei a ouvir um inicio de musica. Reconheci rápido, era minha musica favorita. Descobri que ela me conhecia muito bem. Sabia que eu adorava Djavan e que Cigano era quase um hino! Fiquei calado mais um tempo e então falei:
- Quem é você? - Com uma voz carente - Preciso que fale comigo!
- Ninguém!!! Disse ela e desligou, bem antes dos 5 minutos normais.
Fiquei sem saber o que fazer, coloquei o telefone no gancho e fui tomar banho. Àquela altura eu só queria que “amanhã” chegasse!
Dormi bem cedo, mal comi e não assisti quase aula nenhuma. A noite quase não viu meus olhos.
No dia seguinte, acordei umas 11:50. Irritado, sai andando pela casa, de cueca e sem óculos perguntando pra todos se alguém tinha me ligado, mas só uma tal de Alice havia ligado pro meu irmão.
Eu estava muito aborrecido, não estava disposto a ver ninguém. Só queria ouvir o silencio sádico daquela menina. Ao mesmo tempo eu ria porque era loucura aquilo tudo, afinal, como o silencio poderia Ter me cativado tanto? Como eu poderia Ter me apaixonado por uma invenção de sei lá quem!???(provavelmente minha!)
No fundo eu sabia a resposta mas até hoje eu não respondi pra mim mesmo.
E foi assim durante 3 longos meses, Acordando antes das 10 pra esperar o telefone tocar para ouvir nada.
terça-feira, 21 de maio de 2002
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