quinta-feira, 5 de agosto de 2004

Hoje (quando eu terminar este post já vai ser "ontem", mas tudo bem) morreu Henri Cartier-Bresson. Pra muita gente isso não quer dizer nada. Pra muita gente, Bresson não passa de mais um nome um pouco citado, com um som reconhecido, mas com um sentido pouco comum.



Não foi ele, no entanto, que fez com que eu me apaixonasse por fotografia. Aliais, não foi nenhum fotógrafo que fez isto comigo, mas a própria fotografia. Bresson, assim como Verger, veio depois... apresentado por um fotógrafo amigo meu, através de um livro de fotos, Bresson foi o primeiro para quem eu disse "um dia eu chego lá"...



A fotografia dele "fala"... é encantadora pelo cuidado, pela inquietação que causa... muitas delas são bem poéticas e infelizmente não tenho nenhuma aqui para mostrar... e sabe o que ele dizia? "Por que falam tanto de mim? É só fazer boas fotografias que vocês serão reconhecidos"... putz! "boas fotografias" eu até faço, mas como Tassinha dizia ontem, há um limite... todo mundo pode chegar num limite de "boas fotografias", usando bem um equipamento e umas técnicas báscias... mas o que Bresson fazia era mais do que isso... bem mais... ele fazia arte...



Um dia fiz uma foto que me lembrou muito Bresson... lembrou o tal "momento decisivo"... com as devidas proporções, claro! Tá lá no fotolog... quem quiser, dá um saque!
Não tenho tido muito saco para escrever... não há muito o que falar... vou colocar umas coisinhas ou outras de vez em quando para não perder o costume...



Que é o ser humano? (Leonardo Boff*)



5.novembro/2003 - Brasil - Quem somos nós? Cada cultura, cada saber e cada pessoa procura dar-lhe uma resposta. A maioria das compreensões são insulares, reféns de certo tipo de visão. No entanto, as contribuições das ciências da Terra, englobadas pela teoria da evolução ampliada, nos trouxeram visões complexas e totalizadoras, inserindo-nos como um momento do processo global, físico, biológico e cultural. Mas elas não fizeram calar a pergunta, antes,a radicalizaram.



Quem somos, afinal? O ser humano é uma manifestação do estado de energia de fundo,donde tudo provém (vácuo quântico),um ser cósmico, parte de um universo entre outros paralelos, articulado em nove dimensões (teoria das cordas), formado pelos mesmos elementos físico-químicos e pelas mesmas energias que compõem todos os seres, habitante de uma galáxia, uma entre duzentas bilhões, dependendo do Sol, estrela de quinta categoria, uma entre outras trezentas bilhões, situada a 27 mil anos luz do centro da Via-Láctea, perto do braço interior da aspiral de Órion, morando num planeta minúsculo, a Terra. Somos um elo da corrente única da vida, um animal do ramo dos vertebrados, sexuado, da classe dos mamíferos, da ordem dos primatas, da família dos hominidas, do gênero homo, da espécie sapiens/demens, dotado de um corpo de 30 bilhões de células, continuamente renovado por um sistema genético que se formou ao largo de 3,8 bilhões de anos, portador de três níveis de cérebro com dez a cem bilhões de neurônios, o reptiliano, surgido há 200 milhões de anos, ao redor do qual se formou o cérebro límbico, há 125 milhões de anos, e por fim completado pelo cérebro neo-cortical surgido há cerca de 3 milhões de anos, com o qual organizamos conceptualmente o mundo, portador da psiqué com a mesma ancestralidade do corpo, que lhe permite ser sujeito, psiqué estruturada ao redor do desejo, de arquétipos ancestrais e de todo tipo de emoções e coroado pelo o espírito que é aquele momento da consciência pelo qual se sente parte de um todo, que o faz sempre aberto ao outro e ao infinito, capaz de criar e captar significados e valores e se indagar sobre o sentido derradeiro do Todo, hoje em sua fase planetária, rumo à noosfera pela qual mentes e corações convergirão numa humanidade unificada.



Ninguém melhor que Pascal (+1662) para expressar o ser complexo que somos: "Que é o ser humano na natureza? Um nada diante do infinito, e um tudo diante do nada, um elo entre o nada e o tudo, mas incapaz de ver o nada de onde é tirado e o infinito para onde é engolido". Nele se cruzam os três infinitos: o infinitamente pequeno, o infinitamente grande e o infinitamente complexo (Chardin). Sendo isso tudo, sentimo-nos incompletos e ainda nascendo. Estamos sempre na pré-história de nós mesmos. E apesar disso experimentamos que somos um projeto infinito que reclama seu objeto adequado, também infinito, chamado Deus.



E somos mortais. Custa-nos acolher a morte dentro da vida e a dramaticidade do destino humano. Pelo amor, pela arte e pela fé pressentimos que há algo que vai além da morte. E suspeitamos que no balanço final das coisas, um pequeno gesto de amor verdadeiro que tivermos feito vale mais que toda a matéria e a energia do universo juntas. Por isso, só tem sentido falar, crer e esperar em Deus se Ele for sentido como prolongamento do amor, na forma do infinito.



* Teólogo.